Um artigo escrito pela juíza
do Trabalho Andréa Nocchi
Confira, abaixo, a íntegra
do artigo escrito pela juíza do Trabalho Andréa Nocchi. O artigo foi publicado
pelo jornal Zero Hora de Porto Alegre e posteriormente no Portal Trabalho
Seguro do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Enquanto a prioridade for produzir de modo globalizado
e massificado, a vida não valerá nada. ANDRÉA SAINT PASTOUS NOCCHI*
Na linda música
"Deixando o Pago", o cantor e compositor Vitor Ramil escreve
"que o mundo é pequeno e que a vida não vale nada". A morte de mais
de 1.100 trabalhadores no desabamento de um prédio em Bangladesh, no final de
abril, e o número oficial de 2012 de 2.717 brasileiros que perdem a vida em
acidentes de trabalho, demonstram sim, que o mundo é pequeno e que a vida não
vale nada.
Pequeno porque a distância
entre o Brasil e Bangladesh é imensa, mas a realidade que envolve as precárias
condições de trabalho de milhares de pessoas e a desconsideração com a vida
humana nos aproximam; pequeno, porque quando trabalhadores, na sua maioria
mulheres, perderam suas vidas naquele desabamento e em outros incêndios que
antecederam a tragédia, estavam confeccionando roupas para as grandes marcas da
indústria têxtil mundial, que o brasileiro consome ou sonha consumir. Algumas
delas, pressionadas pela repercussão deste e de outros acontecimentos, firmaram
acordo para fiscalizar e financiar medidas de segurança e contra incêndio nas
fábricas de Bangladesh.
A tragédia traduzida em
morte anunciada tem, pelo menos, três facetas de perversidade. Uma, o trabalho
escravo e a total falta de apreço com condições mínimas de dignidade. Outra, a
fragmentação dos modos de produção que as terceirizações e todas a divisão da
cadeia produtiva disseminam, de modo a desprezar quem e de que forma se produz
para valorizar, apenas a capacidade de produção e, ainda, uma terceira,
vinculada com à morte por acidente de trabalho.
Qualquer enfoque faz as
fronteiras entre o Brasil e Bangladesh desaparecerem neste mundo pequeno. E a
vida, que não vale nada lá, também nada vale aqui. Silenciosamente, cerca de
sete trabalhadores perdem a vida por dia no Brasil. É mais que o dobro das
mortes da tragédia do Paquistão, todo o ano, ano após ano. De tão grave o
flagelo, a Organização Internacional do Trabalho pensa em uma campanha mundial
para a prevenção de acidentes, o governo brasileiro começa a divulgar ações
neste sentido e o Tribunal Superior do Trabalho tem um programa especialmente
desenvolvido para conscientização e redução das mortes e doenças profissionais.
Mas, enquanto a prioridade
for produzir de modo globalizado e massificado, com baixíssimo custo de
altíssimos lucros, a vida não valerá nada e o mundo continuará a ser pequeno,
na comunhão das tragédias.
Juíza do Trabalho/RS
Fonte: Portal do Trabalho
Seguro
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