Em artigo publicado pela
Folha de São Paulo, o deputado estadual de São Paulo Carlos Bezerra (PSDB),
falou sobre o risco do Projeto de Lei do Senado - PLS 432/2013, de
regulamentação da Emenda Constitucional - EC 81/2014, que expropria áreas
urbanas e rurais onde for comprovada prática de trabalho escravo, ser aprovado
na Comissão Mista de Consolidação das Leis e Regulamentação
Constitucional.
O parlamentar afirma que
além de descaracterizar o conceito de trabalho escravo – retirando os termos
“condições degradantes” e “jornada exaustiva” – o Projeto também pretende
esvaziar a “Lista Suja”, o cadastro de empregadores autuados por cometer a
prática.
De acordo com Bezerra, não
há sentido em mudar qualquer conceituação no Código Penal. “A exploração do trabalho
escravo é um crime tipificado de forma objetiva em leis conhecidas e largamente
aceitas pelos tribunais brasileiros”, afirma no texto. Ele também diz que os
Auditores-Fiscais do Trabalho caracterizam o trabalho escravo por um conjunto
de evidências comprovadas nos locais fiscalizados e não por exigências
consideradas pelos empregadores como insignificantes.
Após a votação na Comissão
Mista de Consolidação das Leis e Regulamentação Constitucional, o PLS 432/2013,
de autoria do senador Romero Jucá (PMDB/RR) passará pelos plenários da Câmara e
do Senado.
Leia o artigo abaixo.
8-7-2014 - Folha de S. Paulo
O Brasil sob a chibata
CARLOS BEZERRA JR., 46,
deputado estadual (PSDB-SP), é presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito
do Trabalho Escravo na Assembleia Legislativa de São Paulo e autor da lei
paulista contra a escravidão
Aproveitando a euforia em
torno da Copa do Mundo, o Congresso Nacional tenta empurrar goela abaixo do
país um projeto de lei que pode destruir os avanços brasileiros na luta contra
o trabalho escravo.
Em uma única manobra, se
pretende relaxar a tipificação de trabalho escravo no Brasil e destruir a Lista
Suja do Trabalho Escravo, um dos principais mecanismos de luta contra esse
crime.
A emenda constitucional nº
81/2014 foi aprovada depois de mais de uma década de tramitação. Ela estabelece
a expropriação sem indenização de imóveis urbanos e rurais nos quais se explore
trabalho escravo. Nesses casos, o imóvel será destinado a projetos de reforma
agrária e habitação.
Poderia ser um avanço, não fosse
o “tapetão”. A emenda só entra em vigor com a regulamentação, que será dada
pelo projeto de lei nº 432/2013 do Senado, a ser apreciado nesta terça-feira
(8) pela comissão que trata da regulamentação de dispositivos da Constituição
Federal e de consolidação de legislação.
Isso só será necessário
pois, segundo os parlamentares, o Código Penal define o crime de “redução à
condição análoga à de escravo”, mas não o trabalho escravo. Não passa de um
jogo malicioso de palavras.
A exploração do trabalho
escravo é um crime tipificado de forma objetiva em leis conhecidas e largamente
aceitas pelos tribunais brasileiros. A legislação leva em conta um conjunto de
situações: servidão por dívidas, restrição da locomoção, trabalhos forçados,
jornada exaustiva e condições degradantes de trabalho.
O que se pretende com o
projeto de lei nº 432/2013 é demolir a construção jurídica que tornou o Brasil
um exemplo mundial no combate ao trabalho escravo, reconhecido pela Organização
das Nações Unidas e pela Organização Internacional do Trabalho. Apenas
condições medievais de exploração de pessoas se configurariam como trabalho
escravo e os culpados teriam apoio legal para manter tudo em segredo.
Para se ter uma ideia, nem o
exemplo clássico da escravidão moderna, a servidão por dívidas, seria
automaticamente alvo de punição. Precisaria antes ficar provada a
impossibilidade de fuga do trabalhador. Sem ameaça, coação, restrição de
locomoção ou impedimento de acesso a transporte, não haveria trabalho escravo.
Passariam a ser punidas
apenas ações típicas da violência criminal e deixaria de ser levada em conta a
violência social causada pela falta de opção que leva alguém a trocar a própria
dignidade pela sobrevivência sob o jugo de quem é capaz de tratar pessoas como
objetos. Ganhariam os réus em milhares de processos.
O projeto também pretende
proibir que, antes do trânsito em julgado, sejam inscritos em qualquer cadastro
público as partes em processo de trabalho escravo. Sairiam imediatamente vencedores
na Justiça todos aqueles que, depois de um flagrante, tentam contestar a Lista
Suja do Trabalho Escravo, aniquilando uma das mais importantes armas na luta
contra esse crime.
É importante reforçar que a
escravidão moderna se caracteriza legalmente como um conjunto probatório e não
há nenhuma legitimidade nos argumentos simplistas de que haveria autuações por
questões como colchão fino demais nos alojamentos ou bebedouro inadequado, por
exemplo. O fiscal registra todas as infrações, da mais grave à mais leve.
Não podemos permitir que,
numa manobra sorrateira, contando que a Copa do Mundo e o recesso parlamentar
mobilizem as atenções, o Congresso Nacional coloque sob as solas dos sapatos do
poder econômico conceitos fundamentais da nossa Constituição: a dignidade
humana e o valor social do trabalho.
Fonte: SINAIT
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe seu comentário ou dúvida, que entraremos em contato!