Um dos maiores problemas
atuais vivenciados pela Justiça do Trabalho diz respeito às perícias médicas
nas ações acidentárias, porque faltam peritos verdadeiramente de confiança dos
juízes, que aceitem o encargo. A Justiça do Trabalho, que com a EC 45/2004 recebeu
a incumbência de julgar as ações acidentárias em face dos empregadores, não tem
estrutura adequada par isso e os peritos particulares, em algumas comarcas,
findam por querer ditar as regras do jogo, pois sabem que os juízes precisam
deles. Todavia, não obstante a necessidade e importância do seu trabalho, são
eles auxiliares dos juízes. Quem conduz e julga a demanda é o juiz. O melhor
seria, para resolver ou amenizar o problema, que a Justiça do Trabalho
mantivesse um quadro próprio de peritos, porém, enquanto isso não ocorrer, só
resta conviver com os peritos particulares, cabendo aos magistrados direcionar
o seu trabalho e, com punho forte, estabelecer as regras da sua atuação.
Nas ações perante a Justiça
do Trabalho envolvendo acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, os objetos
são os pleitos de indenizações por responsabilidade civil (danos moral,
material e estético e pela perda de uma chance) e por reintegração no emprego,
neste último caso, com base no artigo 118 da Lei 8.213/1991 e em normas
coletivas, que asseguram estabilidade provisória aos acidentados.
O papel da perícia nestes
casos envolve a verificação do nexo causal, a existência de dano e sua
extensão, a incapacidade ou capacidade residual de trabalho da vítima, o
percentual de invalidez ou invalidez total e a possibilidade de readaptação em
alguma outra função na empresa.
É de grande importância a
perícia nas ações acidentárias para o deslinde da causa, embora não seja o
único meio de prova, cabendo ao juiz valer-se dos demais elementos existentes
nos autos. A perícia, por óbvio, será feita por profissional habilitado, que
detenha conhecimentos técnicos para auxiliar o juiz. De acordo com o artigo 420
do CPC, “a prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação”.
Na forma do artigo 2º da
Resolução 1.488/1998 do Conselho Federal de Medicina, o médico perito deve
adotar em relação aos vários fatores responsáveis por um evento acidentário, o
seguinte:
“Para o estabelecimento do nexo causal
entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame
clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve
o médico considerar:
I — a história clínica e ocupacional,
decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;
II — o estudo do local de trabalho
(grifados);
III — o estudo da organização do trabalho
(grifados);
IV — os dados epidemiológicos;
V — a literatura atualizada;
VI — a ocorrência de quadro clínico ou
subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
VII — a identificação de riscos físicos,
químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;
VIII — o depoimento e a experiência dos
trabalhadores (grifados);
IX — os conhecimentos e as práticas de
outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde”.
Assim, não basta o exame
clínico da vítima, porquanto, e de grande importância, são o estudo do local e
da organização do trabalho, o depoimento e a experiência dos trabalhadores
colegas da vítima em relação ao presente e ao passado, isto porque a empresa
pode ter feito importantes alterações modificando as condições, métodos e
organização do trabalho, o que deve ser levado em conta pelo perito.
De outra parte, para mostrar
lisura e permitir igualdade entre as partes, não pode o perito criar empecilhos
ao acompanhamento das diligências nos locais de trabalho pelas duas partes,
cabendo ao juiz assegurar esse direito em igualdade de condições para não
perpetrar cerceamento de defesa e, consequentemente, nulidade do processo.
Ao Estado-Juiz cabe, como
questão de ordem pública, buscar a verdade real para, na lição de Aristóteles,
dar a cada um o que é seu.
Na forma do artigo 436 do
CPC o juiz não se vincula à conclusão do perito, podendo decidir a causa
agregado a outros fatores colhidos nos autos, valendo-se da prudência e da
lógica do razoável, atento aos fatos, indícios, presunções e a observação do
que ordinariamente acontece.
Não são poucos os casos no
dia a dia na Justiça do Trabalho, em que o perito não esclarece a contento e
suficientemente a matéria objeto da perícia, sendo necessário e de boa política
judiciária, na busca da verdade real, que o juiz, de ofício ou a requerimento das
partes, nomeie outro perito e no final aprecie as duas perícias para bem
decidir a questão, cabendo-lhe apreciar livremente o valor de uma e de outra e,
se for o caso, em situações extremes de dúvida, pode até nomear um terceiro
perito. O objetivo maior do Judiciário, portanto, é esclarecer a verdade dos
fatos e, a partir daí, dar a cada um o que é seu por direito.
Por Raimundo Simão de Melo
Fonte: Consultor Jurídico
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