Ao abastecer um carro, o
frentista está exposto aos vapores de diversas substâncias que compõem a
gasolina, entre elas, o benzeno. A exposição torna-se maior com outras
atividades no posto, como transferir para reservatórios subterrâneos o
combustível trazido da distribuidora e se acumula conforme o tempo de serviço
nesses ambientes. Não há "paninho" em volta da mangueira que dê
jeito.
"É comum trabalhador
reclamando de dor de cabeça, cansaço, tontura, irritação nos olhos e na pele,
ânsia de vômito. Além de tudo isso, as frentistas correm outros perigos. A
gente sabe que, durante a gravidez, o benzeno pode até causar abortos e mal
formações" diz o secretário-geral do Sindicato dos Empregados em Postos de
Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo de Campinas e Região (Sinpospetro),
Raimundo Nonato de Souza, o Biro.
De acordo com o dirigente,
os trabalhadores, mesmo assim, seguem firmes no trabalho. "Faltam só
quando o caso se agrava para uma doença séria. O problema é que, quando isso
acontece, não conseguem comprovar que a doença começou no trabalho e
dificilmente vão conseguir a aposentadoria especial de direito", ressalta
Biro.
Assim como os frentistas,
trabalhadores da extração e refino de petróleo, petroquímicas, siderúrgicas e
outras empresas que utilizam benzeno na produção estão expostos aos riscos à
saúde causados pelo agente químico. Volátil, inflamável e explosiva, essa
substância derivada do petróleo, também presente em óleos lubrificantes,
querosene, solventes, tintas, asfalto e na queima de carvão mineral, pode
causar males ainda mais graves que os listados por Biro: com o passar do tempo,
podem levar a dificuldades respiratórias, convulsões, perda de consciência e
diversas doenças no sangue que podem matar, como a leucemia.
Todo esse dano à saúde é
conhecido desde a década de 1930, mas só em 1994 o governo brasileiro incluiu
na categoria dos agentes cancerígenos a substância para a qual não existe
limite seguro de exposição. No ano seguinte, trabalhadores, governo e
empregadores brasileiros assinaram o Acordo do Benzeno.
O documento instituiu a
Comissão Nacional Permanente do Benzeno, com comissões regionais e toda uma
legislação para regulamentar a produção, uso e a segurança dos trabalhadores.
Entre elas, a permissão do uso somente em setores nos quais o agente ainda não
pode ser substituído, como extração e refino de petróleo, petroquímicas,
indústrias gráficas, calçadistas, de couro, tintas e vernizes.
"Outro avanço trazido é
a obrigatoriedade de cadastramento dessas empresas, que ficam obrigadas também
a acompanhar periodicamente a saúde dos trabalhadores do setor. A cada seis
meses, eles fazem exame de sangue", explica a tecnologista Elisabeth
Aparecida Trevisan, da Fundação Jorge Duprat e Figueiredo (Fundacentro),
vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego.
Quando o teste traz
alterações ou em caso de acidentes, como vazamentos, o trabalhador é submetido
a um exame que mede a exposição ao benzeno no ambiente de trabalho e permite
estimar o risco ao levar em conta as formas de exposição e de absorção pelo
organismo - o chamado indicador biológico de exposição.
Trata-se de uma substância
bioquímica, constituinte do próprio organismo, cuja concentração (ou atividade)
em tecidos, no sangue, na urina ou mesmo no ar exalado tem relação com a
exposição ambiental a um determinado agente tóxico. No caso do benzeno, ao ser
inalado ou absorvido pela pele é transformado no fígado - a biotransformação -
e excretado na urina.
Atualmente, o indicador
utilizado no Brasil para o benzeno é o ácido trans, transmucônico na urina
(AttM-U), que substituiu um mais antigo, chamado fenol urinário, que demonstrou
ter baixa sensibilidade quando a concentração do benzeno no ar é baixa,
inferior a 1,0 ppm. Entre as vantagens do AttM-U estão a sensibilidade e a
simplicidade de análise. Porém, estudos mostram que esse indicador é
`mascarado` por fatores ambientais e individuais, como o hábito de fumar,
alimentação e até mesmo aspectos genéticos.
Isso porque substâncias
presentes no cigarro (entre elas o próprio benzeno), nas bebidas, em alguns
conservantes alimentícios e até certas características genéticas podem
interferir na biotransformação e alterar o resultado. "Isso prejudica o
trabalhador porque muitas vezes o empregador questiona os resultados dos
exames, alegando que o trabalhador não foi exposto ao benzeno e sim que fumava
demais ou tinha problemas na alimentação", aponta Newton Siqueira, diretor
do Sindicato dos Químicos da Bahia.
Existem outros indicadores
biológicos de exposição ao benzeno, como o ácido fenil mercaptúrico, que é
avaliado por médicos do trabalho para a possível inclusão no Protocolo para
Utilização de Indicador Biológico da Exposição Ocupacional ao Benzeno.
Instituída pela Portaria 34, de dezembro de 2001, a diretriz ainda não foi
atualizada.
Para discutir as vantagens e
desvantagens dos indicadores disponíveis, trabalhadores e representantes dos
ministérios da Saúde, do Trabalho e Emprego e de empregadores estiveram
reunidos no começo desta semana, na sede da Fundacentro, em São Paulo.
"Essa discussão é
importante para aprimorarmos a quantificação e qualificação da exposição, com
parâmetros que associem entre si todos os efeitos tóxicos do benzeno sobre o
trabalhador. Sem isso, fica impossível estabelecer o nexo entre a doença e a
exposição a agentes tóxicos no ambiente de trabalho", explica a professora
do Departamento de Análises Clínicas e Toxicologia da Universidade Federal de
Minas Gerais Leiliane Coelho André.
A pesquisadora e professora
de Toxicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Solange Garcia,
destaca que, nos últimos anos, aumentou o número de estudos para avaliar os
prós e contras dos diversos marcadores biológicos. "Seja qual for (o
marcador biológico), seus dados mostram que a exposição, mesmo em baixas
concentrações, traz muitos prejuízos à saúde, o que reforça a necessidade de
aprimoramento da vigilância para que os problemas não venham a ser detectados
quando pouco se pode fazer pela qualidade de vida de um trabalhador que
adoece", diz.
Fonte: Revista Proteção
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