O número
de ações ajuizadas pela Advocacia-Geral da União (AGU) para que o Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS) seja ressarcido pelos gastos com benefícios
pagos a vítimas de acidentes de trabalho provocados por negligência das
empresas, as chamadas ações regressivas, cresceu 144% nos últimos cinco anos,
na comparação com os cinco anos anteriores. Foram 2.236 processos abertos entre
2010 e 2014, uma média de 447 por ano, contra 915 no período entre 2005 e 2009,
média anual de 183 (confira no quadro abaixo).
No total,
as unidades da Procuradoria-Geral Federal (PGF), órgão da AGU responsável pelas
ações regressivas, já moveram 3.621 processos de ressarcimento ao INSS pelos
gastos com acidentes de trabalho desde 1994. Neles, a Procuradoria pede para
que R$ 673 milhões sejam pagos à autarquia previdenciária pelos gastos já
efetuados e pelos que ainda serão realizados com trabalhadores e familiares que
recebem benefícios como aposentadoria por invalidez ou pensão por morte, entre
outros, após a ocorrência de acidentes que poderiam ter sido evitados se as
empresas em que trabalhavam cumprissem as normas de segurança.
A maioria
das ações ainda está em andamento, mas a AGU obteve decisões favoráveis em 65%
das que já foram julgadas. Um percentual que está crescendo. No ano passado,
por exemplo, quase 80% dos pedidos de ressarcimento julgados foram acatados
pela Justiça.
Somente
nos últimos quatro anos, R$ 8,6 milhões foram ressarcidos ao INSS por empresas
condenadas em ações regressivas. E, assim como o percentual de decisões
favoráveis, o valor recuperado também cresce cada vez mais rápido. Entre
janeiro e outubro deste ano, por exemplo, a autarquia previdenciária recebeu de
volta R$ 3,01 milhões. Quantia que já supera a arrecadada ao longo de todo o
ano passado, R$ 2,97 milhões, e é o triplo do recuperado em 2011, apenas três
anos atrás, quando empresas condenadas pagaram R$ 1 milhão ao Instituto.
Os
números poderiam ser ainda maiores, já que não levam em conta os acordos feitos
pela AGU nos quais as empresas aceitam pagar uma indenização aos cofres
públicos antes mesmo do ajuizamento de uma ação judicial. Uma estratégia que é
cada vez mais adotada como forma de agilizar o repasse do dinheiro para o INSS
e, ao mesmo tempo, desafogar os tribunais.
Mão de
obra e jurisprudência
De acordo
com o procurador federal Nicolas Francesco Calheiros de Lima, da
Coordenação-Geral de Cobrança e Recuperação de Créditos (CGCOB), três fatores
ajudam a explicar o crescimento do número de ações regressivas e o
correspondente aumento nos valores ressarcidos ao INSS. Primeiro, a nomeação, a
partir de 2007, de quase mil novos procuradores federais, o que assegurou às
diversas unidades da PGF espalhadas pelo país mais mão de obra para trabalhar
nos casos. Segundo, a decisão administrativa da própria Procuradoria de
considerar as ações regressivas cada vez mais prioritárias, o que se refletiu,
por exemplo, na criação de unidades especializadas no tema dentro do órgão,
como o Núcleo de Estudos em Ações Regressivas Previdenciárias (Nearp). E, por
fim, o reconhecimento cada vez maior dos tribunais do país do direito que o
INSS tem de ser ressarcido por gastos que só teve por causa do comportamento
irregular de empregadores.
"A
PGF adquiriu uma expertise nesse tipo de ação e na identificação de algumas
causas de acidentes mais comuns. O Nearp, por exemplo, participa da elaboração
das minutas, decide questões relativas ao ajuizamento, aos procedimentos de
instrução, e orienta os colegas a ajuizar de uma forma mais efetiva",
detalha o procurador. "Existe uma escala de prioridades. A gente busca
perseguir os benefícios pagos por morte, por incapacidade. Existe uma triagem
prévia do que é mais importante ajuizar. Como é uma ação muito delicada e, de
certa forma, ainda recente, a gente não ajuíza simplesmente o que aparece. A
gente faz uma seleção prévia, que é o que vai dar mais resultado",
acrescenta Nicolas.
E a
tendência para os próximos anos é o número de ações aumentar e,
consequentemente, do montante recuperado para o INSS crescer ainda mais. Além
dos acidentes no ambiente de trabalho, a PGF tem dedicado cada vez mais
esforços a outros dois tipos de ações regressivas: as de violência doméstica,
em que é solicitado o ressarcimento ao INSS pelos gastos com benefícios pagos a
mulheres e dependentes que tiveram que se afastar do trabalho após sofrerem
agressões dos parceiros ou até mesmo foram assassinadas por eles, e as de
ilícitos no trânsito, em que é cobrado do motorista que provocou um acidente ao
desrespeitar as normas os gastos com benefícios pagos à vítima da colisão.
"Como
foi aberto um leque maior de possibilidades, vai haver um processo de
consolidação e a Justiça, assim esperamos, vai criar jurisprudência favorável,
vai reconhecer a legitimidade do INSS para ajuizar este tipo de demanda, e sem
dúvida os números tendem a aumentar. E nossa intenção é fazer uma diferença na
redução desse risco social", explica o procurador federal.
Casos
São Paulo
lidera o ranking de estados com maior número de ações regressivas, com 625,
seguido por Rio Grande do Sul (420) e Minas Gerais (411). Na lista de unidades
com mais de 100 ações regressivas ajuizadas, aparecem ainda Amazonas, Ceará,
Distrito Federal, Espírito Santo, Pará, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e
Santa Catarina. Na outra ponta, a das unidades da federação com o menor número
de ações regressivas, estão Roraima, Rondônia e Mato Grosso.
Foi no
Rio Grande do Sul que ocorreram dois dos casos mais emblemáticos de ações
regressivas movida pela AGU até agora. Em um deles, procuradores federais
cobram em um só processo coletivo o ressarcimento pelos gastos do INSS com as
pensões por morte de 12 pessoas que faleceram durante o trágico incêndio na
casa noturna Kiss, ocorrido em janeiro do ano passado. A ação ainda não foi
julgada pela Justiça. No outro, a Justiça Federal do Rio Grande do Sul acatou
pedido da AGU para condenar a empresa Frangosul a indenizar a autarquia
previdenciária pelos gastos com benefícios pagos a 111 funcionários lesionados
no ambiente de trabalho.
No caso
mais recente de decisão favorável à Previdência Social em uma ação regressiva,
também no Rio Grande do Sul, a empresa Motrisa foi condenada a indenizar o INSS
em R$ 40 mil pelas despesas que a autarquia teve e ainda terá com a pensão por
morte paga à esposa de um operário atingido por duas pilhas de madeira no
momento em que armazenava o produto em uma estufa.
A
Procuradoria-Seccional Federal em Passo Fundo (PSF/Passo Fundo) comprovou que o
acidente poderia ter sido evitado se a empresa tivesse adotado medidas de
prevenção exigidas em lei e não tivesse descumprido, de maneira negligente, as
normas de segurança do trabalho. Foi demonstrado que não havia escoramento
lateral das pilhas de madeira que desabaram, medida que impediria o incidente
se tivesse sido adotada. Além disso, o empilhamento do produto foi feito sem
planejamento algum, em terreno irregular, e os trabalhadores encarregados da
tarefa não haviam passado por nenhum treinamento para realizá-la, não foram
alertados sobre seus riscos, não trabalhavam com equipamentos de segurança
básicos, como capacete, e ainda estavam submetidos a jornadas de trabalho
exaustivas, o que comprometia a capacidade de desempenhar as atividades de
maneira correta.
"Nada
mais plausível que assegurar à Previdência Social o direito de ver-se
ressarcida pelas despesas que injustificadamente terá que arcar em razão da
negligência de outrem e em prejuízo dos recursos públicos, pois o erário
público e, em última análise, a sociedade que o custeia, não podem assumir o prejuízo
decorrente de ato ilícito", reconheceu a decisão da Justiça Federal do Rio
Grande do Sul.
Papel
didático
Para
Nicolas Francesco Calheiros de Lima, da CGCOB, além de recuperar recursos
preciosos para o INSS, as ações regressivas têm um papel didático fundamental
ao contribuírem para conscientizar as empresas sobre a importância de observar
as normas de segurança no trabalho. "Às vezes, a gente fica muito atento
aos números e esquece que a regressiva tem uma função pedagógica excepcional,
que ela diminui a quantidade de acidentes de trabalho e diminui alguns riscos
sociais como a violência doméstica e ilícitos no trânsito", conclui o
procurador.
Por:
Ascom/AGU
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