Aprovado pela Câmara dos
Deputados na noite da última quarta-feira (8), o texto-base do projeto de lei
que regulamenta a terceirização ainda percorrerá um longo percurso antes de
entrar em vigor sob a forma de lei. Podendo, inclusive, ser vetado total ou em
parte pela presidenta Dilma Rousseff.
Devido a um acordo feito
pouco antes da votação, os destaques apresentados ao texto do relator do
projeto, deputado Arthur Oliveira Maia (SD-BA), só serão apreciados e votados a
partir da próxima terça-feira (14). O que, na prática, significa que ele pode
sofrer alterações na própria Câmara. Além disso, o projeto ainda passará pelo
Senado e, se sofrer mudanças, voltará à Câmara antes de chegar à Presidência da
República, que pode sancionar ou vetar o projeto total ou parte dele.
Na quinta-feira (9), a
presidenta Dilma admitiu que o governo acompanha “com muito interesse” a
tramitação do projeto. Para a presidenta, as “questões” ligadas à terceirização
precisam ser regulamentadas, mas a prática “não pode comprometer direitos dos
trabalhadores”, nem “desorganizar o mundo do trabalho”.
O ponto polêmico do texto
aprovado é o que autoriza a terceirização total das atividades das empresas
públicas e privadas, inclusive da chamada atividade-fim – aquela que identifica
a área de atuação de uma companhia. Atualmente, apenas atividades-meio, como,
por exemplo, limpeza e segurança, podem ser ocupadas por trabalhadores
terceirizados. Esse deverá ser um dos aspectos mais debatidos daqui para
frente, já que, para os que se opõem ao texto aprovado, a permissão para a
terceirização das atividades-fim vai além de regulamentar o que já existe.
O deputado Alessandro Molon
(PT-RJ), que recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a votação por
entender que ela é inconstitucional, considerou que a aprovação do texto-base
foi uma dia "extremamente" triste para o Parlamento e para os
trabalhadores brasileiros. “Os trabalhadores foram apunhalados pelas costas na
Câmara, com a retirada de direitos que levaram décadas para serem conquistados
e que foram perdidos em uma votação”. Segundo ele, hoje são 45 milhões de
trabalhadores com carteira assinada e desses, 33 milhões empregados diretos e
12 milhões terceirizados. “O que vai acontecer nos próximos anos é a inversão
desses números”.
Apesar de amplamente adotada
há pelo menos três décadas, não há, no Brasil, nenhuma lei que regulamente a
prática - apenas uma súmula, a 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A
falta de regulamentação tem causado ações trabalhistas contra as empresas que
terceirizaram parte de suas atividades - mesmo que, na prática, estas não
tenham vínculo empregatício com os prestadores de serviço - razão de ser da
terceirização.
Os críticos do PL 4.333,
entre eles o Ministério Público do Trabalho, temem que, com a “expansão
indiscriminada”, a prática se torne a opção preferencial de muitos
empregadores, com prejuízos como a redução dos salários e a diminuição do
número de postos de trabalho. Segundo um estudo do Departamento Intersindical
de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e da CUT, um trabalhador
terceirizado recebe, em média, 24% a menos que outro com vínculo empregatício
direto com a empresa onde o serviço é executado. Apesar de, em geral, trabalhar
três horas semanais a mais.
Contrárias ao projeto de
lei, entidades sindicais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a
Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e organizações
sociais como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e Movimento
dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) prometem mobilizar suas bases e promover, no
próximo dia 15, um protesto nacional contra o avanço da proposta e em defesa
dos direitos trabalhistas.
Para a CUT, a possibilidade
das empresas terceirizarem suas principais atividades modifica toda a relação
trabalhista, possibilitando a precarização dos postos de trabalho e reduzindo
direitos assegurados pela Consolidação dos Direitos Trabalhistas (CLT). Pouco
antes da aprovação do texto base, o procurador-geral do Trabalho, Luís Camargo,
também se manifestou contrário ao PL 4.330. “Na prática, o resultado será a
maior fragmentação dos trabalhadores, mais precarização, menores salários e
piores condições de trabalho. O cenário também levará ao desaquecimento da
economia, problemas na arrecadação fiscal e rombo na Previdência Social”,
alertou o procurador-geral.
A Força Sindical, favorável
à regulamentação do setor, sustenta que a aprovação do PL 4.330 garantirá os
direitos dos milhares de trabalhadores terceirizados que se encontram à margem
da legislação. Quanto às críticas à possibilidade de terceirização da
atividade-fim, a central destaca como uma segurança o fato do texto-base
garantir que essas só poderão ser feitas para outra companhia da mesma
categoria econômica.
Ao contrário dos que temem o
aumento do desemprego e a redução dos salários, a Confederação Nacional da
Indústria (CNI) sustenta que, numa economia em crise, na qual o Índice de Medo
do Desemprego registrou, em março (32,1%), a maior taxa de crescimento desde
1999, a regulamentação da terceirização vai melhorar o ambiente de negócios no
país, propiciando melhores condições para a geração de empregos e crescimento
econômico. Segundo a CNI, 70% das indústrias brasileiras já recorrem à
terceirização e a aprovação do PL 4.330 dará maior segurança jurídica às
empresas e trabalhadores terceirizados.
Ainda de acordo com a CNI,
75% das indústrias que terceirizam parte de suas atividades cobram, das terceirizadas,
o pagamento das obrigações trabalhistas (INSS, FGTS e outros) e o cumprimento
das normas de segurança e trabalho. Dado que suscita entre os críticos da
terceirização o medo de que os terceirizados deixem de receber os benefícios
trabalhistas e o aumento do número de acidentes, devido à menor capacitação dos
empregados terceirizados.
Para tentar evitar que isso
ocorra, o texto-base aprovado estabelece alguns requisitos para o funcionamento
das prestadoras de serviço, como a obrigatoriedade da apresentação periódica, à
companhia contratante, dos comprovantes de pagamento das obrigações
trabalhistas. Além disso, o projeto de lei estabelece que as empresas que
terceirizarem suas atividades serão solidariamente responsáveis por essas
questões. Além do mais, caso se torne lei, será responsabilidade da contratante
garantir as condições de segurança e saúde dos trabalhadores terceirizados que
estiverem a serviço em suas dependências.